Fresca? Não! Bem criada.

Tag: consumo

05
mar

Moda de propósito

Começo de ano é sempre assim, renovação, novos planos, fazer melhor o que deixamos pra trás nos meses anteriores. O mesmo clichê que embala o final de um ciclo e o início de outro. Sim, é uma vibe pra lá de piegas que bate na gente nessas épocas, mas não dá pra não se contagiar pela motivação de fazer diferente nas próximas 365 oportunidades que estão por vir.

E foi pegando carona nisso que decidi começar a primeira coluna de 2017 falando um pouco sobre o futuro e sobre o que eu desejo para a moda nessa nova caminhada que acabou de começar.

De 2016, a lição que mais ficou foi a de que precisamos desacelerar. Consumir desenfreadamente, já não nos satisfaz mais e trabalhar horas a fio para ganhar muito dinheiro deixou de ser sinônimo de satisfação pessoal. Estamos em um período confuso e é normal que nos encontremos em dúvida sobre questões básicas como estas.

A tão falada crise que se instaurou nos últimos tempos não é só financeira, ela também é reflexo do que somos enquanto sociedade, enquanto consumidores e principalmente enquanto indivíduos. Nossas ações impactam um todo e estamos nos dando conta disso aos poucos, mas com o olhar positivo é possível encontrar na recessão uma oportunidade para a criatividade fluir.

A moda, como já sabemos, é um brilhante reflexo do mundo e de como ele funciona. Dessa forma é necessário aproveitar o momento instável e levar os questionamentos um pouco mais a fundo: será que precisamos de tantas roupas? Será que a moda se limita mesmo ao consumo pelo consumo? Produzir desenfreadamente está bom para quem faz e para quem compra?

O período que estamos vivendo está sendo marcado por inúmeras transições, dentre elas o modo que enxergamos e valorizamos mercadorias. Aos poucos estamos nos desligando dos significados superficiais que os produtos nos trazem, como status, e estamos passando a nos interessar mais sobre a experiência que aquele artigo nos proporciona. Saber de onde vem, quem faz, os impactos que gera no mundo e no meio ambiente, são fatores que nos influenciarão cada vez mais na hora de comprar uma roupa.

Tendo essa transformação em vista, uma parte do mercado de moda já se mostra atento e vem acompanhando o momento transitório investindo em tecnologias, voltando o olhar para o processo de produção, não de forma mecanizada, mas sim humanizada, além da parceria entre produtor e cliente, que convida quem compra a contribuir com o produto de quem faz.

Em meio a tempestade de recessões, estamos em busca de novos propósitos, e com a moda não seria diferente. Elevar as roupas ao local de fala significa empoderar diversas pessoas que estão por trás de sua confecção e as que as vestirão também. Pensar sobre isso na hora de comprar uma peça pode ser um pequeno grande começo para as resoluções revoluções de ano novo. A roupa que não só nos veste o corpo, mas nos veste a alma, é a roupa que veste o nosso futuro.

Elisa Santiago é estudante de Design de Moda e uma eterna amante das ruas e das artes. Acredita na roupa como elemento de fala e empoderamento. É quem está por trás do @tens_razão.

30
nov

See now, buy now – novas formas de consumir moda

A última edição do São Paulo Fashion Week acabou de acontecer no final do mês de outubro e trouxe com ela algumas novidades para o país que podem mudar de maneira significativa os rumos da indústria da moda. Uma dessas novidades é a consolidação do conceito de see now, buy now.

Para quem ainda não sabe o que é isso, a explicação é simples. No mundo globalizado em que vivemos, as informações chegam e vão embora com muita fugacidade, dessa maneira também criamos e descartamos desejos de consumo. O que em um mês é tendência e ansiamos mais do que tudo, no seguinte já é substituído por outro produto.

De olho nessa vontade incessante dos consumidores, surge no mercado um novo jeito de se comprar moda: o see now, buy now (em bom português: veja agora, compre agora). Diversas marcas ao redor do mundo passam então a desfilar coleções que poucas horas após o desfile, entram à venda em lojas físicas ou online. Tudo isso afim de suprir a vontade imediata que sentimos de informações (sejam elas de moda ou a área que for) e compras.
1Karl Lagerfeld para Riachuelo – peças foram comercializadas na passarela, logo após o defile. Foto: Rafael Chacon

Num lugar onde somos bombardeados todo o tempo com marcas incríveis, campanhas bem elaboradas e propagandas inusitadamente sedutoras, é praticamente impossível não despertar aquela vontade de ter para si as tendências do momento. Porém, pensando no outro lado da moeda, é preciso fazer uma pausa para refletir sobre o que o sucesso de iniciativas como essas querem dizer sobre nós, enquanto consumidores.

Um dos pontos mais interessantes dessa questão começa com a profundidade das mercadorias lançadas. Devido ao imediatismo de vendas, marcas passarão a produzir com maior intensidade, ou seja, designers e criadores passarão a fazer roupas para o agora. E o questionamento que permanece é: Será possível transformar o momento presente em coleções tão profundas quanto fazemos com as tendências futuras?

Para processarmos os impactos e efeitos de uma informação de moda e de fato deseja-la, levamos determinado espaço de tempo. Vender a ideia do on time faz com que desfiles passem a ter uma abordagem mais mastigada e de entendimento fácil, além de styling mais comercial, muitas vezes dialogando pouco com conceitos e valores das próprias marcas.2Animale no último SPFW – marca transmitiu desfile ao vivo pela internet e deu início as vendas logo após o evento. Foto: Zé Takahashi

Outro ponto dessa discussão é a relação entre o see now, buy now com produtores e designers que confeccionam suas mercadorias de maneira artesanal, seguindo a ideia do handmade. Para eles é praticamente inviável acompanhar essa mudança do mercado, já que seu modo de produção segue uma linha mais slow. Dessa maneira a competição entre marcas que adotam as novas medidas e as que ainda mantém uma pequena confecção, torna-se muitas vezes complicada.

Com a mesma velocidade que a moda circula, as opiniões também acontecem. Por isso, inúmeras vezes o consumidor se vê confuso em relação aos acontecimentos e fica difícil decidir qual a forma mais justa de se adquirir um produto. Ao comprar uma mercadoria está em jogo não só a tendência imprimida ali, mas também as crenças de uma marca, a mensagem por trás daquele estilo, a sustentabilidade e inúmeras outras questões que estão em ascensão no cotidiano.

O que não devemos deixar de fazer é questionar. Abrir o diálogo sobre os modos de consumo que tanto estamos acostumados é necessário e estar disposto a muda-los ou entende-los é uma bela maneira de transgredir.

O conceito de see now, buy now possui inúmeros lados e é um assunto riquíssimo para se conversar com as pessoas ao redor. A moda em toda sua magnitude, propõe transições, reflete o presente e se lança no futuro, mas o protagonismo dela, quem faz somos nós. Devemos sempre nos lembrar disso e nos conceder a privilégio de pensar sobre ela. Pense sobre a moda você também!

Elisa Santiago é estudante de Design de Moda e uma eterna amante das ruas e das artes. Acredita na roupa como elemento de fala e empoderamento. É quem está por trás do @tens_razão.